Prepare-se, pois vou te poupar mais de mil reais em cursos. Sério! E é simples!
Antes um alerta: Nós não devíamos usar IAs (generativas ou não) que estão sob controle fechado de empresas privadas pois isso dá a elas acesso a informação e poder demais. Busque IAs FOSS.
Em 2023 fiz um post bem completo explicando como as IAs generativas funcionam (e apontando problemas), mas basta saber o seguinte:
- IAs GPT conseguem gerar conteúdos com base no que foi criado por pessoas, mas tem uma visão “borrada”;
- IAs generativas são IAs restritas por projeto e jamais serão IAs gerais. Isso quer dizer que elas não são inteligentes, não tem consciência e sequer realmente “sabem” o que está sendo perguntado e o que estão respondendo;
- Elas deviam ser alimentadas com conteúdo específico de cada área, mas tem sido alimentadas com qualquer coisa já produzida na tentativa de emular uma IA geral;
- Para obter bons resultados é importante procurar definir o melhor possível a área, o tom, a abordagem, etc. Pense em um universo de conhecimento caótico e em ir definindo o melhor possível os conjuntos que te interessam. Exemplo:
- No estudo acadêmico da oftalmologia, como um cientista da área, descreva as doenças que podem afligir o humor aquoso. Use uma linguagem culta, mas coloquial.
- Pedir as fontes pode ser útil, mas elas devem ser bem verificadas. É mais seguro pesquisar autores, termos e conceitos retornados em fontes confiáveis como jornais, revistas especializadas, sites de pessoas que são referência na área;
- Sempre que possível envie um documento de referência, pois isso restringirá ainda melhor os conjuntos de onde serão extraídas as informações.
Pronto! O restante é você encontrar o seu jeito de interagir com esse tipo de inteligência artificial. Cursos avançados de criação de prompt não fazem muito sentido, principalmente porque as empresas de IAs generativas procuram diminuir cada vez mais a necessidade de algum conhecimento especial.
Uma exceção seria um curso com alguém especializado na sua área de estudo e que tem experiência com aquela IA generativa e já conhece os vieses e vícios dela.
Agora que te poupei uns mil reais, sinta-se à vontade para retribuir com um real! Não é o valor que importa, é a demonstração de gratidão. O mundo precisa de mais gratidão!
Podemos ir além!
Talvez o maior desafio ao usar IAs generativas não seja extrair delas os melhores resultados, mas fazer isso da melhor forma para o nosso próprio desenvolvimento.
As IAs generativas tem sido propostas quase exclusivamente como ferramentas ou assistentes para a produtividade, mas o uso preferencial devia ser outro:
- Aumento de produtividade: uso para gerar o que seríamos capazes de fazer e até mesmo para “ter ideias criativas”. É como pegar um carro em vez de andar. É importante perceber que esse uso não exercita nenhuma capacidade do usuário, a não ser, talvez, a de fazer perguntas;
- Desenvolver as nossas capacidades: usos que, na verdade, aumentam a nossa carga de trabalho ao aumentar o escopo dele ou nos levar a refletir sobre a melhor forma a usar. Seria como fazer exercícios em máquinas de academia criadas para aumentar ou direcionar o esforço.
Vamos pensar melhor sobre cada um.
Observação: estou ciente que um estudo recente da Harvard Business Review em fóruns coloca outros usos como mais impactantes ou úteis em 2025, mas não significa que sejam os mais frequentes e tenho outra abordagem para eles (no link).
Aumento de produtividade
Sumarizar documentos, interpretar planilhas, extrair dados de documentos e gerar apresentações gráficas, gerar audiodescrições de imagens, criar textos promocionais para produtos, mudar o tom de um texto de propaganda para diversos outros tons, criar imagens para ilustrar ideias, artigos ou livros, revisar textos, elaborar versões mais prolixas para um email antes e enviar, resumir a versão mais prolixa de um email recebido…
A lista de coisas que podem ser feitas mais rapidamente e com uma qualidade aceitável é gigantesca e tem recebido quase toda a atenção. É importante evitar um erro muito comum, alimentado pela forma como as inteligências artificiais generativas são vendidas: considerar que elas produzem resultados melhores que o de alguém que tenha conhecimentos medianos do tema.
Se o conteúdo a ser gerado for muito trivial, pode ser que não se note diferença. Quando leves imprecisões não forem críticas, como em um texto informal, também não é necessário tanto cuidado, entretanto, em um texto jurídico, em um relatório econômico e outros materiais sensíveis, pelo amor de Turing, avalie atentamente e considere simplesmente não usar IAs generativas para o trabalho evitando que um erro passe despercebido.
O mesmo vale para criatividade. Tudo que uma inteligência artificial generativa é capaz de fazer é “reescrever” com outras palavras o que já foi escrito antes. Caso o trabalho criativo seja descompromissado, talvez não haja problema, mas pense criticamente antes de fazer uma campanha publicitária que promete ser original e criativa.
Bem, fora isso, nenhum mistério aqui.
Esse primeiro uso é inevitável em um cenário de precarização do trabalho e de empresas com déficit de funcionários ou de capital humano, o que infelizmente tem acontecido muito, mas esse tipo de uso das IAs generativas devia ser medido e avaliado constantemente pela empresa procurando formas de reduzir essa necessidade e buscar o segundo uso, que aumenta a qualificação dos funcionários e o capital cognitivo da empresa.
Claro que nós, individualmente, devemos ter a mesma preocupação: o uso dessa ferramenta está apenas aumentando a minha produtividade enquanto atrofia as minhas habilidades ou estou me tornando uma pessoa mais capaz conforme a uso? O custo da acomodação é, como tenho alertado com frequência, acabar ficando em desvantagem competitiva diante até de quem resistiu a usar essas inteligências artificiais dessa forma.
Desenvolvimento das nossas capacidades
Pense em usos que aumentem a qualidade do seu trabalho, seja pela forma, abrangência, profundidade, criatividade…
Começando pelo pior exemplo: eu já quis pesquisar sobre vulcanismo, mas não tinha a menor ideia de referências de cientistas ou publicações especializadas (poderia ter ido na Scientific American ou na Nature, mas eu quis testar uma GPT), então perguntei algo como “No contexto do estudo científico de vulcanologia e vulcões, quais são os principais livros e pesquisadores? Quais são os termos mais comuns na área?”.
Claro que vieram alguns nomes de obras e pessoas que não tinham muito a ver e outros não estavam de fato entre os principais, no entanto, me deu um ponto de partida para seguir a pesquisa a partir de onde fui descobrindo obras e pesquisadores que eram referência, e alguns sites e revistas especializadas.
Se fosse em uma área que conheço bem, primeiro eu teria desenvolvido o meu texto (ou imagem) e depois teria dito “Analise o texto abaixo sobre não sei o que, da área tal e sugira tópicos que foram esquecidos”. Muito embora eu só tenha feito isso duas ou três vezes porque não me agrada ficar alimentando IAs proprietárias com o fruto do meu suor, afinal já roubaram daqui o conceito de pareidolia cognitiva aplicado a como percebemos as IAs, apesar desse site instruir especificamente para não usar o conteúdo para treinar IAs.
Outro uso que pode ser interessante é, depois de criar o seu conteúdo, pedir para a IA criar a mesma coisa e observar se existem similaridades. Caso o produto gerado pela IA seja muito semelhante ao seu, então, lamento, está muito superficial, clichê, e não favorecerá a sua reputação, entretanto é uma oportunidade para melhorar!
Ferramentas como o LanguageTool fazem sugestões pontuais úteis para refletir sobre o uso de vírgulas, concordância e estilo e usam IA GPT para parafrasear. Outras como o Grammarly recorrem mais intensamente a recursos de IA para sugerir adições ao texto. Pessoalmente prefiro as que são mais discretas, como a primeira.
Seja como for, o espírito é sempre procurar usos que exercitem e não que substituam as nossas capacidades.
Conclusão
O uso das IAs GPT para ganhar produtividade muitas vezes será inevitável. O importante é saber que o resultado delas sempre será inferior ao humano em um ou mais aspectos, como procurei mostrar no post de 2023, e devemos manter uma análise crítica avaliando se a qualidade é suficiente para o contexto e se o custo (não necessariamente monetário) compensa.
Devemos nos perguntar sempre se o uso da ferramenta nos ajudou a nos desenvolver ou se realizou algo que seria impossível para nós.
Se o nosso trabalho nos transforma, cada vez mais, em digitadores de pedidos ou perguntas (prompts), acho bem aconselhável procurar outro ou, como fazemos com o sedentarismo físico, buscar uma “academia” mental fora do trabalho, formas para manter a nossa mente, criatividade, pensamento crítico afiados e em desenvolvimento. Podemos fazer como muitas pessoas fazem com calculadoras: elas também fazem um cálculo aproximado de cabeça, até para perceber se acontecer erro em alguma etapa do cálculo. Isso é o bastante para manter a mente afiada.
Links
- Your Brain on LLM: Estudo de pesquisadora do MIT mostrando o efeito negativo do uso de LLMs no desenvolvimento de artigos. Vai ao encontro da minha sugestão de fazer primeiro sem qualquer auxilio e, só depois, procurar em buscadores e por último em LLMs (eu colocaria a consulta de fontes conhecidas antes dos buscadores);
- Os primeiros afetados: IA está implodindo a carreira de recém-formados… Diogo Cortiz – O artigo aponta o uso de IAs para substituir os profissionais em início de carreira e questiona de onde virão os futuros profissionais experientes, reforçando o que eu alerto acima sobre o uso da IA para desenvolver e não substituir as capacidades humanas.
- IAs generativas e extensão da mente #SóQueNão: Críticas minhas a um artigo do Andy Clarke na Nature
- Tem um robô me ajudando- Vida de Jornalista: Nesse episódio do podcast os dois jornalistas falam sobre como, quando e por que estão usando IAs generativas. Considero quase tudo exemplos de bom uso e pela razão certa.
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Foto de Etienne Girardet na Unsplash


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