Acho impressionante a miopia da indústria de entretenimento que insiste em chamar seus clientes de ladrões.
Parece um caso de ganância suicida que as impede de perceber que são empresas de venda de cultura e não de resina e metal dos CDs e DVDs.
Na percepção popular se o pirata consegue ter lucro vendendo a dez Reais (e as próprias distribuidoras adotam preços similares um ano depois do lançamento) então os preços de 40 e até 60 Reais só podem significar uma coisa: estamos sendo roubados! E ladrão que rouba de ladrão…
Está claro para uma vasta quantidade de pessoas que ao dificultar o acesso a torrents e outras formas de baixar conteúdo a migração não será para os caríssimos CDs e DVDs oficiais e sim para os piratas da esquina, que a propósito não são reprimidos pela polícia.
A mensagem para o cidadão comum é clara: Nós queremos seu dinheiro e não confiamos em você.
Que tipo de empatia o cliente pode desenvolver por uma indústria assim?
Nada acontecerá com o mundo em 2012 apesar das profecias maias, entretanto temo pelo futuro da indústria de entretenimento se ela não abandonar a ganância e não olhar para os seus clientes.
Há dois grandes grupos de pessoas que baixam seriados, filmes e músicas da Rede:
- Quem não tem dinheiro para pagar os preços exorbitantes
- Quem jamais compraria aquilo, mas quer dar uma olhada para conhecer
Existe um terceiro grupo bem pequeno, mas que pode aumentar com a perseguição contra o ato lícito dos dois grupos acima: o chamado pirata.
Já que 2012 está ai e a moda é fazer profecias vou arriscar algumas.
Em 2011 surgirá uma produtora cultural que estampará com grande destaque o seguinte na sua tela de entrada:
Somos uma empresa que faz arte e cultura e não um monstro sedento por capital. Baixe livremente toda nossa produção e pague quanto achar justo, se achar justo: Nossa arte tem apenas um proprietário, a Humanidade
O lugar comum dirá que ela irá à falência pois ninguém pagará, afinal todos são ladrões.
Bem…
Essas pessoas nunca foram a Alcântara no estado do Rio de Janeiro.
Alcântara é um bairro do município de São Gonçalo, uma daquelas regiões que os moradores das cidades mais famosas insitem em chamar de periferia ou cidade satélite ignorando como essas regiões muitas vezes são bastante desenvolvidas comercialmente.
Lá existem diversos bares onde multidões esfomeadas pedem seus refrigerantes e pastéis chineses até se fartarem e depois pagam a conta.
Sim, as pessoas comem quase sem controle do estabelecimento e depois informam direitinho quanto consumiram. Elas não saem de fininho sem pagar.
Esse fenômeno não é exclusividade de zonas injustamente consideradas pobres e inferiores. É comum também nas regiões ricas consideradas, e me atrevo a dizer que também injustamente, como individualistas e corruptas.
A enorme maioria das pessoas trata com respeito e honestidade quem as trata com respeito e honestidade. Se não fosse assim os bares de Alcântara teriam falido há muito tempo.
Essa é a lição que a indústria precisa perceber ao custo da sua sobrevivência. Os inimigos não são as pessoas que gostam da sua produção e a consomem sem pagar, o inimigo é sua ganância que a faz falhar na hora de se colocar ao lado do seu cliente e colaborador.
Temos um bom exemplo dessa falha na trilogia Senhor dos Anéis.
Sou um fã apaixonado. Li os livros pela primeira vez em uma semana quando tinha 11 anos. Depois disso já reli umas quatro vezes. Quando o último filme entrou em cartaz passei 12 horas dentro do cinema revendo as versões extendidas dos dois primeiros e depois o terceiro. Quando O Retorno do Rei terminou eu estava em prantos… Os olhos ainda enchem de lágrimas enquanto escrevo… O cinema ficou vazio enquanto eu chorava e uma funcionária limpava o chão sob meus pés.
Sim, Senhor dos Anéis me marcou profundamente!
Mas demorei muitos anos para comprar a trilogia em DVD.
Esperei ansiosamente pelo lançamento da versão extendida dos três filmes no Brasil, mas a Warner decidiu que o meu dinheiro e de todos os outros ardorosos fãs brasileiros de Tolkien (alguns bem mais ardorosos que eu, acredite) não lhe interessa.
Até hoje não vi a versão extendida do último filme e só tenho os DVDs nacionais porque vieram de brinde em outra compra.
É claro que eu posso importar o pacote com as versões extendidas, mas há também a questão das áreas…
Para nos obrigar a comprar a mesma obra duas vezes ou mais os DVDs comprados em uma área só funcionam naquela área. Se você é de outro país precisa se satisfazer com o que eles decidirem (ou não) te vender.
A propósito meu DVD é desbloqueado o que não duvido que seja mais alguma forma de crime, afinal que direito tenho eu de ser fã de animes japoneses?
Em todo caso, se a Warner não quer meu dinheiro será que devo dá-lo a ela importando os filmes? Ou deveria (coisa que nunca fiz por incrível que pareça) baixar as versões extendidas da obra que tanto influenciou minha infância e até hoje me emociona?
Seja qual for a resposta há uma certeza: a indústria de entretenimento não é nossa amiga, ela não trabalha para nós e sim contra nós. No lugar de nos conquistar com sua transparência e senso de coletividade ela nos ameaça com leis e espiões ávidos por nos extorquir dinheiro ou nos punir por gostar tanto de uma obra que cometemos o pecado supremo de escrever uma fantasia inspirada nela, uma fanfic, mas isso merece outro post inteiro do tamanho desse.
Roney, acredito que temos que repensar o conceito de empresa (instituição voltada para resolver problemas das pessoas e ser remunerada por isso de forma justa).
Hoje, as empresas visam o lucro e atender principalmente seus acionistas, de uma forma baseada no modelo informacional, no qual o usuário não tinha poder.
Hoje, com o empoderamento das pontas e seu poder de denúncia, repercussão e organização, este modelo não funciona tão bem.
O usuário vem para o centro das decisões de forma inusitada.
Será preciso rever o papel social das empresas em ser rápida para atender seus clientes nos atuais e prever novos problemas, inovando.
Empresa boa é aquela que corrige rápido!
Assim, como te disse no Twitter, estamos muito mais na sociedade da inovação, do que na de conhecimento, um termo eunuco que não nos leva a lugar nenhum.
A meu ver, estamos à beira de uma revolução francesa que nos levará a um novo capitalismo….como será exatamente, não sei, mas será bem diferente do atual.
Por fim, a queda da bastilha é digital e está em curso.
Concordas?
Nepô.
Do meu ponto de vista, a industria da música teve alguns percalços que nao soube resolver. Deixaram criar uma cultura onde o ipod é caro pra burro, mas o conteúdo é gratis. a descentralização e a quantidade de atores na cadeia produtiva da musica engessa qualquer possibilidade de negociação ágil com novas midias. são milhares de editoras, sociedades arrecadadoras, repasses, ecads e isso tudo com sistemas do arco da velha.. a relutância dos donos dessas instituições é imensa.. ninguem quer mudança. quando saiu a fixação do fonograma, foi uma briga de foice das editoras e copistas de partituras. eles acharam seu lugar e ficaram sossegados.. depois veio o vinil, o K7 (outra briga de foice) e o CD gravável (a maior piada da industria pois enquanto a sony gravadora queria a extinção do CD-R, a Sony Tech. queria disseminar os gravadores para computador) e agora vem o mp3… música é muito cara para ser de graça.. e hoje, é muito gratuita para ser cara… minha grande crença é: governos regulando taxas compulsórias de servidores de internet para pagar os direitos, com controle minimo de identificação do conteudo (assim vc paga pro rata a quem merece), sites baseados em anuncios e doações para conteúdo (como o que eu idealizei criei com ajuda de dois amigos, http://www.direitomusical.com).. dai sim.. vai ter espaço para outros horizontes…. a União européia já da sinais de organização nesse sentido… o problema é que 10 anos já passaram desde o napster…