Imagem:California Historical Society Collection, USC Libraries
A princípio esse post iria para a sessão gotas, afinal seria apenas um comentário rápido à visão da Lyft sobre o impacto das mudanças no uso dos carros nos próximos 10 anos.
No entanto o artigo merece ser mais comentado pois, realmente, a mudança do carro individual dirigido por humanos para carros coletivos autônomos por si já deve levar a mudanças radicais em nossa estrutura social, urbana, cultural, econômica como já comentei ano passado ao falar do Apocalipse Uber.
O artigo mostrando a visão do Lyft está no final desse post.
Dois pontos que não explorei no artigo do ano passado e surgem agora envolvem o que produziu a cultura dos carros e o que mudou agora para marcar seu fim e transição para um outro modelo de civilização.
O século XX foi marcado pelo individualismo. Apesar de ter gerado os sindicatos os cidadãos eram isolados em suas casas, diante das telas de TV e em seus carros.
“Em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”. “O lar de um homem é o seu castelo”.
Não havia a esperança de vida em comunidade além do quarteirão ou dos colegas de trabalho ou escola e, além disso, fatores como o estranhamento decorrente do encontro de culturas graças a grandes movimentos migratórios e de refugiados, nos levaram a buscar um tipo de intimidade sagrada. Nos tornamos solitários.
O século passado foi o século da privacidade em vários aspectos.
A família substituiu a comunidade. Pai, mãe e dois filhos e meio passou a ser o núcleo da sociedade como se essa estrutura fosse milenar e não um fenômeno com poucas décadas. A memória na época era muito mais curta ainda que hoje.
O espaço público deixou de ser humano passando a ser predominante para carros. Observe o tamanho dos shopping centers e dos seus estacionamentos por exemplo.
Claro que outros memes se estabeleciam paralelamente como os próprios sindicatos ainda que, em uma análise mais atenta, também tenham se tornado um fenômeno individualista.
À partir da década de 80, com a popularização de uma outra visão cosmológica que foi despertando nossa atenção para como a Terra é pequena e com a progressiva descoberta de que humanos são muito mais próximos física e culturalmente que a maioria dos outros animais, juntando-se aí as teorias linguísticas de Noam Chomsky, começamos a retornar para a visão de tribo humana.
Claro que não foi pelo acesso direto à ciência, linguística e antropologia que a sociedade despertou para isso (ainda que obras como Megatendências 2000 tenham atingido certa popularidade), mas produtores de conteúdo produziram livros, filmes e séries que codificaram esses novos memes em formas mais contagiosas, pense nos filmes da década de 80 sobre guerra fria por exemplo.
A revolução dos carros é inevitável mas artigos como o mais abaixo continuam presos ao paradigma do indivíduo: será que haverá carros ou a unidade mínima de transporte será um tipo de coletivo para, digamos, 12 pessoas?
Há de se considerar o que Michio Kaku destaca no início do seu livro A Física do Futuro (eu sei… eu sei… Você, pessoa bem instruída cientificamente tem críticas a ele e ao livro, mas deixemos isso para outra hora): as coisas que “vingam” precisam estar de acordo com certas pulsões básicas da humanidade.
A dúvida no entanto é o que é básico afinal? O individualismo ou a coletividade?
Observando de cima vemos que o conceito de família individualizada, privacidade, individualismo é uma exceção recente em nossa história que não persiste há muito mais de 100 anos.
O próprio uso que estamos dando à Internet denuncia que temos um forte impulso para retornar ao sentimento de aldeia, mas agora global.
A propósito… Sobre isso vale a pena dar uma olhada na ideia de Redes Colméia, afinal precisaremos descobrir formas de usar as possibilidades de comunicação para tornar possível uma colméia de 7 bilhões (que devem estabilizar em 10 bilhões) de humanos, humanas, humaninhos, humaninhas e, por que não, outros terráqueos? Mas essa é outra história.
Lyft’s Vision for the Next Ten Years and Beyond Introduction: A Country Built for Cars I remember when I first fell in love with cars. It started small w…
Source: The Third Transportation Revolution – Medium