Ainda há pouco assisti um vídeo sobre o próximo dispositivo disruptivo que estará em todas as pessoas. A conclusão da pessoa apontava para óculos de realidade aumentada com que nos comunicaríamos falando com IAs multimodais (ou seja, capazes de lidar com som, texto, imagem etc). Ele considera que o que smartphones tem de especial e pode ser superado por isso são três características:
- Input – entrada
- Contexto
- Output – saída
Em outras palavras: uma forma natural e simples para interagirmos com o dispositivo, a capacidade de responder ou manter um contexto e uma forma também natural e simples para ele nos trazer informações.
Pronto, te poupei uns 14 minutos vendo um vídeo. Nada contra vídeos, mas para muitas coisas texto é bem melhor, inclusive a capacidade de acessar informação em texto também é muito importante e precisa ser exercitada.
Só que…
Vou discordar.
Em primeiro lugar acho que é mais importante pensar em qual disrupção precisamos do que tentar adivinhar qual será a próxima traquitana que todo mundo usará.
Aliás, a traquitana não é a disrupção e sim como ela é usada.
Para os meus pais o celular é um dispositivo apocalíptico. Por eles vem notícias sobre o fim dos tempos e uma realidade delirante em que tudo está ruindo.
Para mim já foi porta de acesso para varias disrupções: novas formas de contato social, outra estrutura para o quarto poder, mobilidade do trabalho.
O grande segredo do smartphone não é o método de entrada, saída e contexto, mas trazer a Internet para diante dos nossos olhos.
E aí pode parecer que os óculos de realidade aumentada seriam realmente a próxima traquitana, mas pergunto:
Precisamos mergulhar mais fundo na Internet?
Roneyb 2023
Essa é a minha deixa para sugerir que a próxima disrupção que devíamos procurar é na forma de usar a Internet.
Inclusive grande parte da disrupção dos celulares foi ao trazer as redes sociais para o espaço online.
Posteriormente as redes sociais foram sequestradas por algoritmos e agora vemos estudos mostrando que gerações mais novas estão buscando vida fora do online.
No vídeo, que acho que não vale a pena linkar, a primeira observação foi que a era dos celulares estava acabando porque já não vendem como antes, então a indústria precisa criar uma nova traquitana para todo mundo comprar.
Isso provavelmente é verdade, mas é um critério que devemos usar para apontar para uma nova traquitana? Mais importante: vamos aceitar que nos enfiem uma nova traquitana só para aumentar seus valores (já absurdos na faixa dos trilhões de dólares) nas bolsas de valores? Na boa? Nem para o capitalismo isso é bom e muito menos para o meio ambiente lembrando que capitalismo de consumo precisa de… consumidores e em um ecossistema em crise consumidores morrem, consumidores ficam sem recursos para consumir.
Então qual será a próxima traquitana?
Só deixando claro mais uma vez:
Espero francamente que a próxima mania cibernética sejam novas formas de lidar com o ciberespaço. Podemos colecionar fontes confiáveis, migrar para redes sociais feitas para pessoas, rejeitar manchetes que apelam para as nossas emoções…
Tendo isso em mente desconfio que a próxima traquitana é a interoperabilidade entre traquitanas.
Smartphones, smartwatchs, óculos (pq não?), assistentes pessoais caseiros (tipo Alexa), televisores, caixas de som, carros etc. poderiam nos reconhecer e carregar nossas coisas da nuvem para perto de nós.
Esse blog é muito preocupado com privacidade e com o capitalismo de vigilância e temos sérios problemas aí com a entrega da curatela da nossa vida inteira para corporações que podem usar os dados contra nós (post de 2014) ou pior, contra a sociedade como no caso Cambridge Analytica.
Essa seria, então, a segunda nova traquitana: o cuidado com a nossa privacidade e controle dos nossos dados.
Infelizmente, como comento no post mais acima, de 2014, a humanidade está acostumada a ser influenciada por alguma estrutura de poder e essa segunda grande mudança pode ser mais difícil a despeito de todos os esforços das LGPDs, blogs como esse, do Fediverso e de empresas que incluem em seus princípios a nossa privacidade.
Resumindo:
- Traquitana um: interoperabilidade das traquitanas e surgimento de mais algumas como óculos de realidade aumentada, realidade virtual e mistos.
- Tranquitana dois: A busca por redes sociais focadas em pessoas e não em servir a produtos e corporações que vendem seus usuários
- Traquitana três: um novo relacionamento com a nossa privacidade e controle de acesso aos nossos dados
Realisticamente falando a traquitana um é a mais fácil de acontecer porque envolve venda de produtos, novos produtos, mais produtos por pessoa e terá investimento de grandes corporações… Lembrando que grande hoje significa trilhões de dólares, o que provavelmente você e eu sequer conseguimos quantificar.
A traquitana dois está acontecendo. As pessoas estão indo socializar em aplicativos de troca de mensagem ou no Fediverso (ainda que timidamente até aqui).
A terceira também já é possível. Eu mesmo, por exemplo, migrei recentemente todo meu controle de tarefas e gestão de conhecimento pessoal do Evernote para o Obsidian em uma nuvem zero knowledge… Esse é um post que estou devendo. O importante é que já é possível e até fiz post recentemente sobre isso: Por que privacidade importa.
E as IAs GPT?
Deixei de fora a tecnologia que cresceu mais rápido na história das tecnologias! E não foi por esquecimento, foi por birra. Essa é uma das áreas que mais me interessam, com que sonho desde os meus 11 anos mais ou menos quando li Eu, Robô, do Asimov. Para quem não sabe é uma coletânea de contos mostrando o caminho da humanidade para uma civilização mediada e protegida por IAs benéficas.
Apesar disso tudo o que escrevi sobre essas inteligências foi IAs generativa, não sou obrigado!
Resumindo muito: o grande problema é venderem IAs fracas como IAs fortes. Ah! Também é MUITO ruim que elas sejam tecnologias fechadas.
O uso e impactos das IAs são temas seríssimos que precisam ser profundamente analisados, compreendidos, regulamentados.
Penso que o uso delas será inevitável nos novos ecossistemas de traquitanas e isso trará grandes problemas por serem usadas das formas erradas. Problemas indo da redução de capacidades criativas e cognitivas de quem usar errado até um grau de monitoramento da sociedade ainda mais perigoso que aquele possível nas redes sociais mediadas por algoritmos.
No entanto não acho que elas serão tecnologias disruptivas em si, entende? Serão acessórios das novas traquitanas e tecnologias.
Conclusão – importante!
As próximas traquitanas não são o que deve ocupar nosso tempo agora e sim como estamos usando as traquitanas atuais!
Você usa suas redes sociais ou elas te usam? Suas traquitanas estão te ajudando a aliviar suas tensões? Cuidam das suas senhas? Estão cuidando das suas tarefas a fazer? Das informações e conhecimentos que não param de fluir em nossa direção? O que não tem link nesse parágrafo é post que estou devendo!
Pense bem no que suas traquitanas podem fazer para melhorar sua vida, se elas não fazem isso não são boas traquitanas!
Imagem
Foto de Isaac Davis na Unsplash


Deixe um comentário