Manuel Castells, o homem que entendeu o #Occupy

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Cartazes do OcupaRio2011 na Cinelândia
OcupaRio 2011 – Cinelândia

O que está acontecendo no Mundo?

Tenho a impressão de que muita gente ainda prefere se esforçar para acreditar que nada está mudando de fato, afinal mundos em mudança são assustadores e só quem está muito insatisfeito ou tem mais curiosidade que medo encara a barra de olhar de frente para uma “mudança de eras” como diz o Nepomuceno.

Estou no segundo grupo e entendo que a análise lógica nos mostra uma mudança intensa na cultura da nossa civilização.

Capa: Networks of Outrage and Hope - Manuel Castells
Disponível em ebook por R$21,49

Ainda haverá muito a se dizer sobre isso, mas Castells conseguiu desenhar uma visão geral do que que está ocorrendo em nossa civilização passando pela primavera árabe, pelo caso da constituição “crowdsource” da Islândia e pelo fenômeno occupy que chegou a ter reflexos aqui no Brasil em 2011 (não citado no livro de Castells).

Redes de Indignação e Esperança é uma obra que todos deviam ler para ter uma visão mais clara do que está por vir. Na pior das hipóteses a leitura pode te alimentar de um tipo de esperança que é essencial para nos tirar da inércia.

Pode-se dizer que Castells tem uma visão um pouco ingênua em alguns pontos onde ignora alguns obstáculos como a capacidade de ajuste de quem está no poder (por favor, esse “quem” não são pessoas, mas coletividades corporativas muito mais desorganizadas do que os conspiracionistas gostariam. Acho necessário dar esse alerta) e em nossa capacidade de “suportar” condições adversas. Lembrem que atravessamos séculos sendo governados por pessoas que se diziam deuses (Egito antigo etc.)

Mesmo que Castells seja vítima de um deslumbramento otimista a análise dele é científica e não deixa dúvida de que os processos que estamos testemunhando são profundos e, no geral, nos levarão a uma sociedade mais participativa e a um novo tipo de democracia que é menos representativa e mais direta..

A forma como as redes sociais online amplificam o poder de integração das redes sociais offline também é colocada com muita clareza e demonstrada com exemplos práticos.

A propósito o livro oferece uma vastíssima lista de fontes de dados estatísticos e artigos analíticos de ótima qualidade.

Um outro ponto que Castells não aprecia no livro é a hipótese memética que é citada apenas em um parágrafo, mas considero vital para unir os pontos da teoria social moderna.

Por exemplo, há vinte anos, quando as campanhas políticas no Brasil começaram a se valer mais das acusações de corrupção entre adversários, eu comentei que esse era um caminho sem volta, que estava sendo plantado o meme do combate à corrupção e que a opinião pública pediria cada vez mais. Agora milhões de pessoas vão às ruas no país basicamente contra a corrupção e a audácia do governo em reprimir a democracia pelo uso da força policial.

Capa: Redes de Indiganação e Esperança - Castells
Em papel: R$49,90 – Digital R$37,50

Aqui não vai dar para estender a ideia de como a memética nos ajuda a entender os movimentos de massa, mas é bom ler o livro de Castells pensando nisso, procurando completar os espaços onde ela faz falta. Aliás talvez Castells tenha deixado isso de lado justamente por estar mais preocupado nesse livro em descrever o fenômeno e nos dar ferramentas para reflexão.

Mais importante ainda é ter em mente o que vem acontecendo em nosso país.

Fica bem claro no livro de Castells que as condições nos países que se mobilizaram e explodiram em protestos populares viviam situações muito piores que as nossas ou reduções de qualidade de vida. No Brasil vivemos justamente o contrário. Não há – apesar de muitos gostarem de dizer que vivemos um tipo de inferno – problemas sérios no Brasil que justifiquem a mobilização social.

A minha opinião é que o fenômeno se reflete aqui principalmente por dois motivos: o crescimento econômico coloca parcelas cada vez maiores da sociedade ao alcance das informações que podem ser obtidas online e a adoção em massa das redes sociais online amplificam a propagação dos memes de uma população que recupera sua auto-estima.

Mais uma vez acho que vale um alerta: não estou defendendo o governo atual. Creio que o processo é mais ou menos inevitável e aconteceria com qualquer governo. Na verdade não tenho elementos ainda para me arriscar a supor qual governo aceleraria o processo ou até se seria bom que fosse mais rápido.

A essa altura talvez você esteja repetindo em sua cabeça que estou assumindo que há mudanças para melhor, que a humanidade não é uma massa estúpida irremediavelmente manipulada pelas corporações, pela mídia e pela publicidade. Bem… Leia Redes de Indignação e Esperança, é um bom começo 😉

Em tempo. Castells tem uma linguagem fortemente acadêmica, mas nessa obra ele adota um estilo bem mais leve que, creio, será de leitura mais agradávele para o público em geral, bem foi para mim 😉


Comentários

10 respostas para “Manuel Castells, o homem que entendeu o #Occupy”

  1. […] Onde houve Occupy houve um afastamento dos eleitores de esquerda das urnas (ver Manuel Castells) […]

  2. […] Castells é um dos cientistas sociais que melhor entendeu, na minha opinião, a onda de mobilizações sociais que são um tipo de ponta do iceberg das mudanças geopolíticas, culturais e representativas em […]

  3. […] da esquerda realmente abriu espaço para direita. Manuel Castells detectou isso brilhantemente em Redes de Indignação e Esperança (agosto 2013) mostrando que veríamos não uma vitória da direita, mas um fracasso da esquerda em […]

  4. […] essas duas perguntas sugiro a leitura de Redes de Indignação e esperança de Manual Castells, mas podemos resumir como a combinação de uma massa crítica de insatisfação elevada ao patamar […]

  5. […] Redes de Indignação e Esperança, de Manuel Castells já apontava em 2013 que não estamos diante do sucesso da direita e sim do fracasso da esquerda. […]

  6. […] 2011, quando aconteceu o Occupy (e li Redes de Indignação e Esperança do Castells) já se esperava um período de crescimento de estereótipos associados ao viés de direita como […]

  7. […] a tecla que venho repetindo desde 2011, a insatisfação com a democracia representativa e o desejo de uma democracia mais direta que leva a uma ascensão de políticos “não políticos”. E nesse ponto teve algo […]

  8. […] de quase todos os partidos) e com raiva. Podemos chamar de indignação como o Castells em seu Redes de Indignação e Esperança (recomendo muito a leitura), mas quando a esperança cai a indignação vira ódio fácil, […]

  9. […] 2013, quando o povo brasileiro, pelo bem ou pelo mal (isso é assunto para o Meme de Carbono), passou a se mobilizar nas ruas para protestar, foi pelo Twitter que as pessoas conseguiam se […]

  10. […] as estruturas políticas e democráticas (iniciados ainda no final do século passado, mas que só eclodiram globalmente a partir de 2011) os grupos que detinham o controle da mídia e dos principais meios de produção de capital […]

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